Primeiro mês do ano termina com a pergunta:

Até quando apenas um boletim de ocorrência e procedimentos administrativos serão os únicos mecanismos de defesa - sem resultado - do servidor prisional quando agredido?

 

Na Penitenciária I de Presidente Venceslau, o agente penitenciário distribuía o almoço nas celas dos presos, quando em uma das celas por onde passava um dos presos queixou-se da falta de uma toalha que segundo ele havia sido levada durante a revista. O agente não sabia o que tinha acontecido, estava apenas fazendo seu trabalho, ou seja, servindo as marmitas do almoço. O preso irritado, puxou o agente pela roupa, batendo seu corpo contra a porta. O parceiro de cela o auxiliou.

 

Ainda com o barulho todo no momento da agressão, os presos do raio aproveitaram para fazer um “bate grades”. Os funcionários da unidade ajudaram o servidor, acionaram o diretor de núcleo e o sistema de segurança e então, o raio voltou ao controle. O agente saiu do trabalho com lesões no ombro direito e no dedo indicador, além de ameaças e injúrias por parte dos dois detentos.

 

Em outra unidade, o Centro de Detenção Provisória de Piracicaba, outro agente sofreu agressão, neste caso enquanto fazia a contagem no pavilhão A da unidade. Um preso desferiu um soco em seu rosto. Outro preso, no mesmo momento jogou uma caneta que acabou acertando o rosto do agente. Após a agressão o servidor também sofreu ameaças da parte do preso, para que ele e sua família tomassem cuidado ao andar na rua.

 

Daí se pensa: Por que divulgar que uma caneta foi atirada no rosto de um agente? Parece tão pouco. Mas trata-se de uma tentativa da parte do preso de desmoralizar o servidor penal exposto no momento. Tirar dele a valia do controle da sua função e evidenciar sua desproteção. O trabalhador penitenciário vigia e zela pelo funcionamento de um sistema ligado a Lei de Execução Penal que condena o indivíduo a determinada pena caso cometa um crime. A prisão é uma das penas, sendo a guarda e o cuidado do apenado, responsabilidade deste trabalhador, que assegura a sociedade daquele que cometeu o ato criminoso. Dentro dos muros, o trabalhador penitenciário também é esquecido pela sociedade e pelo Estado que não lhe assegura integridade física. Não demonstra respeito pela dignidade e pela vida do trabalhador. Acontece que o dedo indicador do agente é parte dele, do seu corpo, de quem ele é. E quem ele é habitualmente é desconsiderado.

 

As duas agressões descritas no início do texto ocorreram na última semana do mês de janeiro e não foram as primeiras. Janeiro fecha a conta registrando ao todo 7 agressões contra agentes, conforme o SIFUSPESP tem divulgado levantando a bandeira AGRESSÃO CONTRA SERVIDOR É CRIME. Entretanto, esses atos de violência têm sido banalizados ou desconsiderados há muito. Muitas das agressões, por exemplo, deveriam ser registradas no boletim de ocorrência como tentativa de homicídio. Entretanto na sua grande maioria seguem apenas como lesão corporal.

 

Esta é uma luta antiga dos funcionários do sistema prisional que trabalham perante total insegurança diante da falta de investimento. Alguns agravantes que podem ser enumerados como exemplo são os presídios superlotados que facilitam o contato do preso e do agente penitenciário sem garantia de integridade física do último citado, entre outros como ausência de trancas automatizadas nas celas em algumas unidades, sendo que existem prisões com sistemas de fechamento automático reformulado pelos próprios agentes, já que o implementado era ineficiente; o déficit funcional que traz o acúmulo de funções, ou desvio de função como deve ser chamado, já que o servidor acaba obrigado a fazer além de suas funções para que a cadeia funcione, o que acarreta sobrecarga física e psíquica ao servidor, bem acima da que deveria ser habitual, o tornando mais vulnerável.

 

Trabalhar movido a adrenalina, entre outros hormônios gerados pela ansiedade constante, estado de alerta e medo, leva o servidor ao adoecimento, morte precoce (constatada por um estudo da Universidade de São Paulo), uma sobrevida de cerca de 45 anos e muitas vezes suicídios, geralmente não noticiados. O servidor prisional, ao passar por uma experiência de regressão, acaba “massacrado emocionalmente”, sabendo que a natureza do seu trabalho é por si perigosa, e com um sistema desestruturado, com acúmulo de agravantes. A função de agente penitenciário, é considerada pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) a segunda profissão mais perigosa do mundo. Agregado as péssimas condições a que são expostos, os trabalhadores do sistema prisional paulista - e brasileiro - são alvo de agressões, ameaças e homicídios.

 

Esta descrição acima colocada, pequena e rasa, é apenas uma mostra de que o SIFUSPESP continua atento ao servidor penitenciário e a seu sofrimentos diário, sabendo da dificuldade da mudança do quadro perante a atual circunstância político econômica. No momento o governo do Estado movimenta-se para a privatização do sistema penitenciário, ou seja, o intuito é angariar fundos. A segurança, a saúde e o bem estar do servidor não é colocado como prioridade em plano algum.

 

Entretanto, a segurança pública da sociedade passa pelo servidor. A solução do sistema prisional com a maior população carcerária brasileira sob o comando da maior facção criminosa do país passa pelo funcionalismo e pela melhoria de toda uma estrutura que deveria ter sido preservada e ter recebido investimentos, mas que passou e passa pelo sucateamento por parte de Estado tem o dever de cuidar, e não apenas abandonar a população carcerária enquanto lota presídios devido a uma rede de problemas sociais, econômicos, estruturais e políticos.

 

Colocar a administração de unidades prisionais nas mãos de empresários, sem estudos prévios do impacto da ação, justificando a implementação do modelo privado com exemplos falhos é um crime maior. Sobretudo porque custa mais e não se tem nem ideia de como se vai implementar: esse tipo de postura não corresponde a um projeto político que afirma propor algo mais eficiente. Querem matar o servidor penal, começando por sua moral, levantando dúvidas quanto a qualidade do seu trabalho, o afastando sem resguardo. O homem da linha de frente com o preso deve cair no esquecimento por interesse dos donos de empresas, da imprensa e de gestores que olham o Estado como lugar de negócios. Por dinheiro.