Governador afirmou na semana passada que unidades em construção serão geridas via Parceria Público Privada(PPP). SIFUSPESP tem avisado sua categoria a um ano, mesmo sendo sofrendo o risco de ser desacreditado. Estamos preparados para a luta, precisamos de todos.



O SIFUSPESP sempre tem alertado sua categoria de forma antecipada e com estratégia, temos que nos informar e divulgar nossos argumentos para toda sociedade para evitar os ataques que estamos sofrendo na mídia (que não nos dá voz) e nas redes sociais.

 

Considerado pelo governador como o “espelho” de uma boa administração penitenciária, a unidade possui 23% dos detentos trabalhando, contra 27% em média no sistema prisional paulista, incluindo todos os regimes de cumprimento de pena.

O modelo de PPP mineiro abrange apenas a unidade prisional de Ribeirão das Neves, onde estão 2.164 detentos - dados de agosto de 2017, enquanto que em São Paulo os números abrangem todas as 192 unidades prisionais sob controle da Secretaria de Administração Penitenciária(SAP) . De acordo com dados oficiais do Conselho Nacional de Justiça(CNJ), São Paulo possui mais de 225 mil detentos, o cerca de ⅓ do total de presos do país.

Em Minas, o custo por preso por mês para o Estado é mais que o dobro do custo por preso no sistema público em São Paulo. São R$3.750 contra R$1.672. Isso em um universo que envolve, em São Paulo, 100 vezes mais presos.

Os dados foram fornecidos pela SAP e pela Secretaria de Estado de Administração Prisional(SEAP) de Minas Gerais ao jornal Folha de São Paulo, que publicou matéria sobre o tema no dia 02 de agosto de 2018. Contudo estes dados são controversos. No início do processo, a população carcerária não é completa, por consequência, os valores aplicados sobre o número de presos, o valor cresce. Por isso, há uma garantia contratual,  para fazer frente ao valor total acima apontado. O valor cheio então é dividido pela população total.



Trabalho obrigatório de presos

 

Poucos dias após assumir o Palácio dos Bandeirantes, João Dória disse a uma coluna do jornal O Estado de São Paulo que 11 unidades prisionais do interior, que estariam em reforma, passariam a adotar o regime de PPP. Sem detalhar quais seriam essas unidades, o governador não falou sobre como seria elaborada essa parceria, mas disse que ela seria inspirada no modelo de Ribeirão das Neves. Nesta segunda-feira, ele praticamente ratificou por onde vai iniciar sua experiência.

De acordo com a coluna do Estadão publicada em 13/01, a proposta de Dória é que essas unidades “terão espaços de trabalho e que conforme previsto em lei, os presos vão ser obrigados a trabalhar para custear sua permanência dentro das unidades”. O problema é que não existe, ao menos por enquanto, amparo legal para levar adiante essa ideia.

A Lei de Execução Penal(LEP), em vigor desde 1984, deixa claro que em seu artigo 28 que o trabalho do preso será remunerado, com o valor não podendo ser inferior a ¾ do salário mínimo, e que o produto dessa remuneração deverá obedecer os seguintes destinos:

 

  1. a) à indenização dos danos causados pelo crime, desde que determinados judicialmente e não reparados por outros meios;
  2. b) à assistência à família;
  3. c) a pequenas despesas pessoais;
  4. d) ao ressarcimento ao Estado das despesas realizadas com a manutenção do condenado, em proporção a ser fixada e sem prejuízo da destinação prevista nas letras anteriores.

 

Ademais, a norma é inaplicável, pois em seu texto nos informa que a sua proporção deverá ser fixada, fixada por norma do Estado que até o presente momento está em aberto, não nos informando não somente a competência de quem deverá regulamentar essa proporção, como também, qual deveria ser o percentual correspondente ao ente estatal.

Somado a isso, o artigo 34 da LEP fala que o trabalho poderá ser gerenciado por fundação ou empresa pública com autonomia administrativa, e terá por objetivo a formação profissional do preso (e não simplesmente trabalhar para cumprir metas de contratos e metas de PPP). Veja que neste caso, também, a interpretação doutrinária do direito administrativo, em destaque, o consagrado jurista Hely Lopes Meirelles, destaca que a norma jurídica, quando menciona a palavra poder, sobretudo na regulamentação de atividade administrativa, deve ser interpretada, de forma restritiva, como dever estatal e não como faculdade, como muitos, ao desvio e comodidade fora do espírito da lei e da constituição o fazem.

Apesar de previsto “o ressarcimento ao Estado das despesas realizadas com a manutenção do condenado” na LEP, não existe qualquer previsão legal de que o detento seja “obrigado” a trabalhar para bancar sua estadia nas prisões brasileiras. Aqueles que decidem trabalhar contam com o benefício de redução da pena: Um dia a menos na condenação para cada três dias trabalhados, conforme estabelece a legislação.

Há por outro lado, em trâmite na Comissão de Constituição e Justiça(CCJ) do Senado, projeto de lei elaborado em 2015 pelo senador Waldemir Moka(MDB/RS) que altera a Lei de Execução Penal ao instituir “a obrigação de o preso ressarcir o Estado das despesas com a sua manutenção no sistema prisional, mediante recursos próprios ou por meio de trabalho.”

Trata-se portanto de uma proposta que ainda precisa ser apreciada pelos parlamentares, aprovada pelo Congresso e ratificada pela presidência da República antes de entrar em vigor. A informação que vem sendo difundida na imprensa, portanto, não condiz com a letra fria da lei e carece de posterior regulamentação, caso essa alteração seja feita.

 

Repercussão de fala do governador dá vazão a informações falsas

A implementação de PPPs em São Paulo foi uma das promessas de campanha de Dória e de acordo com o que cita a coluna do Estadão, segundo Dória, incluiriam “um aumento no número de vagas no sistema para que os presos pudessem trabalhar e serem reinseridos na sociedade”.

Sem mencionar no que a mudança de gestão impactaria para os trabalhadores penitenciários - que são aqueles que, em administração pública ou privada, são quem asseguram o cumprimento da pena por parte dos detentos. Todas essas publicações ressaltaram que Dória já teria se reunido com o novo diretor do Departamento Penitenciário Nacional(DEPEN), Fabiano Bordignon, para tratar da construção de presídios que permitiriam esse trabalho obrigatório.

Ao falar à rádio Jovem Pan, ainda durante a campanha eleitoral, Dória insistiu na ideia de que Ribeirão das Neves possui “administração privada” e que graças a esse modelo “não entram celulares e não há fugas” no complexo.

A segurança da unidade e a escolta dos presos, no entanto, é feita por servidores públicos, agentes penitenciários nomeados mediante concurso.

Aos terceirizados cabem outras funções, e muito do que é virtude para os mineiros passa por certas particularidades como: alto custo por preso; filtro de periculosidade de detentos; e reparação econômica ao consórcio que administra a unidade prisional caso o estabelecimento não atinja uma lotação “mínima” prevista em contrato.



Modelo de PPP de Minas é duas vezes mais caro na comparação com São Paulo, ineficiente e deixa de fora massa carcerária que transborda nas unidades públicas

 

Conforme relato dos pesquisadores Gustavo Freitas Correa e Lucas Cavanha, da Fundação Getúlio Vargas(FGV), no documento “O primeiro complexo penitenciário de parceria público-privada do Brasil”, a unidade de Ribeirão das Neves está sob um contrato de concessão de 27 anos prorrogáveis por mais cinco. O artigo foi publicado em 2014.

Esta parceria oferece às empresas envolvidas garantias financeiras, “por meio de contraprestações e reequilíbrio econômico” a fim de garantir a lucratividade do negócio. Mais do que isso, o contrato estabelece uma demanda mínima de 90% da capacidade total de presos no complexo para que não haja prejuízo ao consórcio.

São parte desse convênio o governo do Estado de Minas Gerais, através das Secretarias de Defesa Social e de Desenvolvimento Econômico, e o consórcio GPA(Gestores Prisionais Associados Sociedade Anônima), grupo formado por cinco empresas, entre elas a Tejofran Saneamento.

Em 2015, A Tejofran teve sua dissolução solicitada pelo Ministério Público do Estado de São Paulo(MP-SP) por corrupção passiva e ativa ao longo da participação no cartel que atinge as licitações do metrô de São Paulo desde os anos 1990. A empresa também é alvo de investigação por fraudes nas obras da ferrovia Norte-Sul, em Goiás.

Outra das empresas do consórcio, o Instituto Nacional de Administração Prisional(INAP),  tem um histórico de processos movidos por agentes penitenciários terceirizados no Espírito Santo por submeter os funcionários a condições de trabalho degradantes e não pagar direitos como o adicional de insalubridade àqueles que têm de lidar diretamente com os presos, fazer revistas em visitas e outras atividades de risco.

É importante ressaltar que existe ainda um terceiro elemento que integra este contrato. Chamada de “verificador independente”, a empresa Accentuare se responsabiliza por fiscalizar os serviços prestados pelo GPA, dentro de um total de 380 “indicadores de qualidade” e ser os “olhos do patrão”, no caso o governo do Estado. Por esse serviço, é remunerada e o consórcio, se incorrer em erros, é multado.

As obras do complexo de Ribeirão das Neves custaram R$280 milhões e foram pagas pelo consórcio, que venceu a licitação para a PPP em 2009, durante o governo Aécio Neves(PSDB). No espaço, trabalham 800 funcionários terceirizados e mais 300 servidores públicos responsáveis pelo “acompanhamento da execução penal dos presos”.

Cabem aos agentes públicos cuidar da movimentação interna e externa dos sentenciados e também da segurança do entorno do complexo. Já os funcionários da GPA cuidam da vigilância interna, manutenção de infraestrutura e assistência aos detentos. Os salários dos servidores são mais altos na comparação com os empregados do consórcio.

Entre os presos, há uma seleção criteriosa daqueles que podem e dos que não podem viver dentro da unidade de Ribeirão das Neves. Inexistem detentos provisórios, tampouco aqueles considerados de alta periculosidade, membros de facções criminosas ou que poderiam ser alvo de ataques de outros sentenciados, tais como condenados por estupro, pedofilia ou delatores de outros crimes.

Logo, os raros casos de tentativas de fugas, rebeliões e de conflitos entre os detentos possuem uma explicação bastante lógica. O filtro pelo qual passam todos aqueles destinados a cumprir sua pena em Ribeirão das Neves, que seleciona somente os presos que “não vão causar confusão” ou “dar trabalho”. Mas e os demais, onde permanecem? Nas unidades públicas, com investimentos cada vez menores por parte do Estado.

O modelo adotado em Ribeirão das Neves sequer foi levado para o restante de Minas Gerais, onde vigora o sistema público na imensa maioria das penitenciárias, com mais 31 unidades administradas por Associações de Proteção e Assistência aos Condenados(APACs), que são entidades civis de direito privado que recebem recursos do Estado para promover a recuperação dos presos em um sistema ligado à evangelização.



Entendimento do SIFUSPESP sobre o tema

O SIFUSPESP entende que ao definir um perfil dos presos que podem ir para uma unidade privatizada, o consórcio e o Estado pecam por fornecer tratamento diferenciado que culminará na manutenção de uma estrutura ultrapassada no sistema público, para o qual não se apresenta uma solução de fato.

É bastante claro para quem trabalha no sistema prisional, nas demais forças de segurança pública e no Judiciário que não será de um dia para o outro que desaparecerão da lista de sentenciados criminosos condenados por crimes graves, tampouco os envolvidos com facções ou com mau comportamento. E mais, existe o risco do sistema piorar e com o avanço do poder econômico e organizacional do crime organizado, colocar a Segurança Nacional em risco.

Parece pouco clara a afirmação generalista de que o setor privado é mais eficiente. A eficácia de algo tem relação com objetivos, formas de ação e a realidade objetiva, e não com a "crença insistente" em esvaziar a máquina pública e colocá-la na mão de empresários.

Os problemas seguem para as unidades públicas, já que a solução apresentada pela PPP trata de um contingente muito restrito de presos sobre os quais o controle e a segurança são mais efetivos apenas pela prevalência de seu perfil. E a pergunta permanece: O que fazer com os demais?

Sem efetivo suficiente de trabalhadores penitenciários públicos - onde o déficit funcional é assustador e seguidamente alvo de denúncias por parte dos servidores que atuam em unidades superlotadas - como o governador do Estado de São Paulo, que avança no sentido de não mais nomear aqueles que passaram em concursos, pretende criar PPPs e aumentar o número de vagas disponíveis para sentenciados!?

Por outro lado, a instituição da obrigatoriedade do trabalho por parte dos presos para ressarcir o Estado, caso seja aprovada, nos impõe mais um desafio: Quem obrigará o detento a trabalhar? Quem fará a fiscalização desse trabalho? Quem definirá qual a porcentagem do valor gerado neste trabalho vai para manter a estrutura penal funcionando? A Justiça, o agente penitenciário, ou os governos? Um agente privado poderia fazê-lo?

Fábio Jabá, presidente do SIFUSPESP tem observado que: "Para nossa categoria João Dória parece não entender, parece ter medo de conhecer, parece ter medo de combater. Se conhecer saberá que somos valorosos e indispensáveis. Pedimos ao governador que não evite o debate governador Republicano e Democrático real, de políticas públicas e sem discurso marketeiro".

 

Leia a primeira parte deste artigo em: https://www.sifuspesp.org.br/noticias/6357-falando-serio-sobre-a-questao-da-privatizacao-penitenciaria

 

O sindicato somos todos nós, unidos e organizados! Participe da Assembleia Geral, dia 23 de janeiro, na Dr. Zuquim, 244, Santana, São Paulo.